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Amicus Curiae sobre Conselhos Tutelares

Em julho de 2020, a Clínica de Direitos Humanos da UFMG, através do seu eixo de Direitos Sexuais e Reprodutivos, se manifestou na qualidade de Amicus Curiae em Ação Civil Pública que versa sobre a situação de precariedade dos Conselhos Tutelares em Belo Horizonte. A Ação, ajuizada pela Defensoria Pública da Infância e Juventude de Minas Gerais em face do Município de Belo Horizonte, pretende alertar a contínua violação de direitos da criança e do adolescente que ocorre devido ao déficit estrutural existente nos Conselhos Tutelares na cidade. 

Neste sentido, os pedidos da exordial abarcam o aumento e a estruturação dos Conselhos de Belo Horizonte de acordo com a demanda populacional, incluindo a melhoria na infraestrutura e o reforço no número de funcionários de diversas áreas do conhecimento. Além disso, a petição também requer que seja retificado o edital das eleições para Conselheiro Tutelar que ocorreram em 2019, incluindo requisitos necessários para a observância de um processo eleitoral justo. Por fim, a petição também pleiteia a inclusão de rubrica específica para cada um dos Conselhos Tutelares na próxima lei orçamentária municipal.

Os Conselhos Tutelares representam peça chave na articulação do Sistema de Garantias de Direitos (SGD) da criança e do adolescente, visando a garantir a este grupo o acesso à proteção integral e ao pleno desenvolvimento humano. Segundo o Conselho Nacional de Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA), para a execução de programas bem organizados que prestem atendimento efetivo, seria necessário uma unidade do Conselho Tutelar para cada 100 mil habitantes. Assim, um cenário ideal para Belo Horizonte seria de 25 unidades para uma população estimada de 2,5 milhões de habitantes, segundo dados do IBGE. Contudo, atualmente são somente 9 unidades, o que alerta para uma violação sistemática de direitos fundamentais das crianças, adolescentes e seus familiares. 

 O Eixo Temático de Direitos Sexuais e Reprodutivos acompanha casos de afastamento arbitrário de bebês de núcleos familiares vulnerabilizados. Neste contexto, desenvolve trabalhos sobre direitos destas mães e crianças em situações de vulnerabilidade por meio de um estudo do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), da doutrina e de jurisprudências sobre o tema. Além disso, reconhecendo a importância dos Conselhos Tutelares para a sociedade, em outubro de 2019, realizou um evento em praça pública buscando atrair a atenção da população local para as eleições de conselheiro tutelar que ocorreria ainda naquele ano. 

Assim, devido à sua experiência, o Eixo DRS reconhece o papel essencial do Conselho Tutelar na rede de proteção, legitimando-se como Amicus nesta ação. A decisão que deferiu o ingresso no processo reconheceu que a “UFMG é instituição acadêmica de renome internacional, constituindo-se em terceiro imparcial, comprometido com o progresso e difusão da ciência, podendo contribuir a alcançar o provimento jurisdicional mais acertado”.

A manifestação elaborada pela CdH focou principalmente na análise da relação entre os Conselhos Tutelares e as unidades de acolhimento institucional de crianças e adolescentes e as maternidades públicas, a partir de sua atuação prática. Neste sentido, argumentou-se que o enfraquecimento e a desvalorização do Conselho Tutelar impede a aplicação de medidas de proteção menos gravosas (consideradas prioridade, segundo a Doutrina da Proteção Integral) culminando na maior demanda por medidas de afastamento da criança ou adolescente de seu núcleo familiar. 

Ocorre que sem o arcabouço estrutural básico para o exercício das funções dos Conselhos Tutelares, a Vara da Infância e Juventude acaba assumindo grande parte das funções do órgão, no que diz respeito à aplicação de medidas de proteção (art. 101 e art. 129, ECA) e de acompanhamento de sua respectiva execução. Mas a centralidade na judicialização das demandas pode trazer como prejuízo a construção de soluções insuficientes em casos complexos, com desalinhamento da rede de assistência e enfraquecimento dos demais integrantes do Sistema de Garantias de Direito da Criança e do Adolescente.

O Amicus também mostrou como o orçamento municipal é aplicado de maneira equivocada, sendo destinado a maior parte dos recursos para unidades de acolhimento institucional, demonstrando uma preferência do município pela institucionalização desses bebês. Nota-se essa preferência orçamentária pela comparação entre o grande número dessas Unidades ao número de Conselhos Tutelares no município, como pode ser visto no mapa a seguir, de elaboração própria:

Além disso, outro grave sintoma que demonstra a fragilidade na atual estrutura dos Conselhos Tutelares da cidade é sua relação com as maternidades públicas, que somente os veem como um órgão que encaminha casos para a Vara. Deste modo, dentro da rede de proteção, os Conselhos Tutelares não são vistos como um participante fundamental e ativo que prestaria atendimento para evitar as medidas mais gravosas nos casos concretos.

Por fim, resta destacar que, segundo o ECA, o poder Judiciário também integra a rede de proteção à criança e ao adolescente, devendo se responsabilizar e garantir direitos previstos na Doutrina de Proteção Integral. Dessa forma, o Amicus reiterou a importância desta ação e do deferimento dos pedidos para cessar com essas graves violações de direitos da criança e do adolescente.

 

Fonte:

  1. https://cidades.ibge.gov.br/brasil/mg/belo-horizonte/panorama